fevereiro 01, 2005

Mais Verissimo



Depois de começada a trilogia o Tempo e o Vento, uma boa ideia para a reedição da obra completa do escritor, a Companhia das Letras lança Ana Terra, de Erico Verissimo -- parte da saga, claro, juntamente com os três volumes de O Arquipélago, O Retrato e O Continente , já reeditados. Já tinha chegado às livrarias a nova edição de Incidente em Antares. Um extracto de Ana Terra:
«Ana Terra descia a coxilha no alto da qual ficava o rancho da estância, e dirigia-se para a sanga, equilibrando sobre a cabeça uma cesta cheia de roupa suja, e pensando no que a mãe sempre lhe dizia: "Quem carrega peso na cabeça fica papudo". Ela não queria ficar papuda. Tinha vinte e cinco anos e ainda esperava casar. Não que sentisse muita falta de homem, mas acontecia que casando poderia ao menos ter alguma esperança de sair daquele cafundó, ir morar no Rio Pardo, em Viamão ou até mesmo voltar para a Capitania de São Paulo, onde nascera. Ali na estância a vida era triste e dura. Moravam num rancho de paredes de taquaruçu e barro, coberto de palha e com chão de terra batida. Em certas noites Ana ficava acordada debaixo das cobertas, escutando o vento, eterno viajante que passava pela estância gemendo ou assobiando, mas nunca apeava do seu cavalo; o mais que podia fazer era gritar um "Ó de casa!" e continuar seu caminho campo em fora. Passavam-se meses sem que nenhum cristão cruzasse aquelas paragens. Às vezes era até bom mesmo que eles vivessem isolados, porque quando aparecia alguém era para trazer incômodo ou perigo. Nunca se sabia. Uma vez tinham dado pouso a um desconhecido: vieram a saber depois que se tratava dum desertor do Presídio do Rio Grande, perseguido pela Coroa como autor de sete mortes. O pai de Ana costumava dizer que, quando via um leão baio ou uma jaguatirica, não se impressionava: pegava o mosquete, calmo, e ia enfrentar o animal; mas, quando via aparecer homem, estremecia. É que ali na estância eles estavam ressabiados.»

1 comentário:

Silvia Chueire disse...

Li O Tempo e o Vento quando tinha em torno de dez ou onze anos. Ana Terra devo ter lido umas três vezes, impressionada sempre com a força,a coragem, a beleza da história, da Ana.E principalmente porque aos meus olhos infantis tudo decorria como num filme. Eu via claramente paisagens, ambientes e personagens.E abosorvia o sentimento gaúcho. Ainda hoje me lembro de como "sonhei " o Rio Grande Do Sul, aqueles lugares todos. As vidas, as tramas.
Uma abraço, não pude resistir comentar minha lembrança da obra de Érico Verissimo.

Silvia Chueire