«Não acho totalmente ruins esses projetos para disciplinar jornalistas. Gostei principalmente da idéia de definir critérios para os trajes a serem usados no exercício da profissão. Poucas coisas afetam o funcionamento de uma redação como o comprimento das saias usadas por certas jornalistas, por exemplo. Esta é uma área em que algum tipo de padronização é obviamente necessária. Caberia ao Conselho, ou à Ordem, ou ao que quer que seja que vá nos disciplinar, estabelecer limites máximos e mínimos para as saias desde que ficasse claro não haver qualquer intenção de controlar o conteúdo. Não imagino como seria um traje adequado para cronistas. Talvez algo na linha do blazer azul, camisa aberta ao peito em tom pastel, calças cinzas e sapatos tipo mocassim. Algo, enfim, para distingui-los das categorias inferiores. Para as moças, blazers também, mas com um cachecol cuja cor variaria de acordo com o assunto de que tratam (rosa shocking para a política, verde debênture para a economia, etc.). A regulamentação dos trajes para cronistas enfrentaria alguns problemas práticos na aplicação, como o que fazer com as meias coloridas do Zuenir. Proibi-las simplesmente seria um inaceitável cerceamento da liberdade de expressão dos pés do cronista. Tornar o uso de meias coloridas iguais às do Zuenir obrigatório para todos os cronistas só aumentaria os protestos contra a escalada do autoritarismo tipo soviético neste governo. Hoje só meias como as do Zuenir para todos, amanhã só o Pravda. A solução seria um dispositivo especial da nova lei que isentasse as meias do Zuenir do artigo que trata das nossas vestes. O que se esperaria dos responsáveis pelos projetos para disciplinar jornalistas é que tivessem a sensibilidade e o bom senso de rever este item. Pelo menos este.»
agosto 19, 2004
Verissimo sobre as meias de Zuenir
E se está errado?
agosto 18, 2004
Gonçalves de Magalhães e a poesia
«Não se pode lisonjear muito o Brasil de dever a Portugal sua primeira educação, tão mesquinha foi ela que bem parece ter sido dada por mãos avaras e pobres; contudo boa ou má dele herdou, e o confessamos, a literatura e a poesia, que chegadas a este terreno americano não perderam o seu caráter europeu. Com a poesia vieram todos os deuses do paganismo; espalharam-se pelo Brasil, e dos céus, e das florestas, e dos rios se apoderaram. A poesia brasileira não é uma indígena civilizada; é uma grega vestida à francesa e à portuguesa, e climatizada no Brasil; é uma virgem do Hélicon que, peregrinando pelo mundo, estragou seu manto, talhado pelas mãos de Homero, e sentada à sombra das palmeiras da América, se apraz ainda com as reminiscências da pátria, cuida ouvir o doce murmúrio da castanha, o trépido sussurro do London e do Ismeno, e toma por um rouxinol o sabiá que gorjeia entre os galhos da laranjeira.»
Domingos Gonçalves de Magalhães, Suspiros Poéticos e Saudades.
[Gonçalves de Magalhães (Domingos José Gonçalves de Magalhães, Visconde de Araguaia), médico, diplomata, poeta e dramaturgo, nasceu no Rio de Janeiro a 13 de agosto de 1811, e faleceu em Roma a 10 de junho de 1882.]
Blogs 2
Para leitores de Clarice Lispector, vale a pena uma visita ao Perto do Coração Selvagem. Gui Lamenha, que vive em São Paulo, fez o seu blog em homenagem à escritora.
Dapieve
Estejam atentos a Arthur Dapieve, que acaba de publicar De cada Amor tu Herdarás só o Cinismo (edição Objetiva), romance. Dapieve escreve no O Globo, no No Mínimo e aparece no GNT/Brasil. Este é um dos seus mais recentes textos de opinião.
Bethencourt e a magia
O historiador português Francisco Bethencourt terá mais um livro seu publicado no Brasil: trata-se de O Imaginário da Magia, edição da Companhia das Letras.
Murilo
um olho andando, com duas pernas.»
Murilo Mendes
Blogs 1
«Estados Unidos do Brazil, 100 réis, Correios, 1905. Os atracadouros, os veleiros fundeados, os trapiches, o céu amarelo de Benedito Calixto. O beijo. O beijo no barulho do bar. O beijo que foi um roçar de cílios e superfícies, a pele do meu rosto sobre a pele do rosto dele, assim : as capitanias hereditárias, os esconderijos arqueológicos, o destino dos nossos olhos, a estação das barcas.»
Rubem e o Kama Sutra
Imprensa
A última flor do Lácio, again
Garcia-Roza manda Espinosa descansar
O novo livro de Garcia-Roza não terá o delegado Espinosa como protagonista. Não tem título, ainda, mas é uma traição aos admiradores do mais famoso polícia carioca de Copacabana. Os livros de Garcia-Roza são publicados em Portugal pela Gótica, no Brasil pela Companhia das Letras.
Ruy Castro & Carmen Miranda
Justamente Ruy Castro, o autor das biografias de Nelson Rodrigues e de Garrincha (Estrela Solitária): a próxima biografia é dedicada a Carmen Miranda e sairá na Companhia das Letras durante o próximo ano. Ainda não tem título definitivo – mas Ruy Castro esteve em Marco de Canaveses, a terra-natal de Cármen Miranda. O mais recente livro de Ruy Castro é Amestrando Orgasmos (edição da Objetiva) mas o mais citado é ainda Carnaval no Fogo. Crônica de uma Cidade Excitante Demais, uma história do Rio de Janeiro – e de Copacabana, mais exactamente (Companhia das Letras), que foi um dos finalistas do Jabuti. Um extracto de Carnaval no Fogo: «Se Vespúcio voltasse hoje à cidade, quinhentos anos depois, como seria? Em 1502, ao defrontar-se com o Pão de Açúcar, ele vira na Guanabara algo muito parecido com a ideia que os antigos faziam do Paraíso: um carnaval de montanhas, serras, praias, enseadas, ilhas, dunas, restingas, manguezais, lagoas e florestas, tudo sob um céu que não tinha fim. Uma obra-prima da natureza, habitada por uma gente feliz, bronzeada e amoral. […] Uma vida tão feliz e paradisíaca que deixava muito mal a ideia, então corrente entre os jesuítas, de que os selvagens não tinham alma.» Ruy Castro viveu alguns anos em Portugal e já dedicou ao Rio alguns dos seus livros, como Ela é Carioca, Uma Enciclopédia de Ipanema. Eu acho que o romance sobre Bilac, Bilac vê Estrelas, também é sobre o Rio, claro.
agosto 17, 2004
Nelson para fanáticos
Depois do trabalho memorável de Ruy Castro sobre a obra do dramaturgo (desde a monumental biografia, Flor de Obsessão, até à edição da série de livros perdidos ou esquecidos), a Companhia das Letras acaba de lançar O Baú de Nelson Rodrigues, reunião de crónicas publicadas entre 1928 e 1935, período em que Nelson trabalhou nos jornais A Manhã, Crítica e O Globo. O trabalho de edição é de Caco Coelho. O Baú de Nelson Rodrigues recolhe dois tipos de texto: crónicas literárias de um lado, histórias de polícia do outro. 308 páginas para coleccionadores.